Mas não agora.

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Sabe, naquele minuto em que você passou do meu lado e sorriu pra mim, o mundo ao meu redor desacelerou e começou a girar em câmera lenta.

Era uma sexta-feira e o expediente já havia acabado. Juntei meus papéis e peguei minha bolsa enquanto te espiava de longe. Antes de me virar para ir embora, consegui enxergar você parado no corredor por um milésimo de segundo. Mas o que eu não vi, enquanto caminhava devagar para o elevador, foi o momento decisivo em que você parou, pensou e começou a correr para me alcançar.

A cena se desenrolou como num filme: você corria em slow motion, enquanto Something, dos Beatles, tocava na trilha sonora. A câmera se dividia entre acompanhar sua corrida e me filmar de costas, esperando o elevador chegar ao andar. Sabe como é, para aumentar a expectativa de quem estivesse assistindo àquela sequência. Então a luz acendeu, as portas se abriram e eu consegui colocar a ponta do pé dentro do elevador no exato momento em que você segurou o meu ombro.

A música parou e eu me virei para ouvir você falar, enquanto tomava fôlego: “─ Quer sair comigo?” O meu sorriso largo foi a resposta que você esperava.

Fomos para um barzinho ali perto, tomar cerveja barata e dividir um prato caríssimo de camarão. E dividimos os cansaços do escritório, alguns sonhos e muitos planos para o futuro. Depois dividimos a conta e o táxi para voltar pra casa. Minha casa era mais perto do que a sua, mas quando eu ia sair do táxi,  você se aproximou e me beijou, enquanto o taxista aumentava a música no som do carro, que por coincidência era Something. Dá para acreditar numa coisa dessas? Dentre as milhares de sensações que tive naquela hora, só conseguia pensar: “finalmente.”Daí pra frente vieram os gostos parecidos, as piadas que só nós entendíamos e principalmente, o gosto de gostar do que estava acontecendo. Não demoramos muito para assumirmos o relacionamento para o pessoal do escritório, que já esperava que isso acontecesse desde sempre. Acontece que nós éramos uma combinação perfeita, dessas que só acontecem de cem em cem anos. Como queijo e goiabada, rede e praia, café e chocolate. Éramos bons separados, mas deliciosos juntos.

Resolvemos oficializar e morar juntos, já que vivíamos no apartamento um do outro e não dava vontade de ir embora nunca. Um dia paramos de fingir que existia outro lugar onde quiséssemos estar. Nossa casa era de fato, a nossa cara. Meus livros na estante, seus quadros pendurados na sala. Um buldogue velho e ranzinza pra cuidar, um bom sofá, canecas combinando e uma caixa de filmes antigos para assistir, daquele nosso diretor predileto. Depois viriam as crianças, que teriam seus olhos escuros e o meu sorriso rasgado. Nós quatro poderíamos brincar de guerra de água no banheiro, ler juntos e assistir desenhos animados no sábado de manhã. E o meu amor por você só ia se multiplicar e se espalhar naquelas paredes, gastando até eu achar que havia acabado. Com certeza iríamos brigar falando baixo, para não acordar as crianças. Até você me trazer bolo de limão na cama e pedir desculpas improvisando uma música engraçada no violão.

Para resumir, eu diria que “era pra ser”, “estava escrito”, e todas essas frases clichês e idiotas que a gente usa quando quer explicar que gosta muito de alguém.

Poderia ter sido assim. Nós teríamos sido felizes. E ainda podemos ser.

Se agora, enquanto eu te olho sorrir e andar para o corredor, enquanto imagino todas essas coisas que nos aguardam, essa história de amor escrita por mim mesma durante esse minuto, se você apenas parar para pensar. Se você me olhar de novo e conseguir enxergar esse futuro que não aguenta mais esperar para acontecer, essa vida que pode ser nossa, basta você querer. Agora mesmo, enquanto você para, eu prendo minha respiração e conto os segundos até você entender que eu sou perfeita para ser imperfeita com você. Que eu estive aqui, esperando para finalmente ser seu par nesse filme que eu já assisti cem mil vezes dentro da minha cabeça. Imaginei cada fala, cada sorriso, cada close que a câmera dava nos seus olhos, cada beijo nosso enquanto os créditos subiam na tela.

Mas dessa vez, a sua hesitação durou menos do que um segundo. E você continuou pelo corredor até eu não conseguir mais te ver, com meus olhos embaçados de lágrimas.

Arrumei os papéis, peguei a minha bolsa e esperei pelo elevador sozinha. Ainda olhei para trás uma última vez, só para ver se quem sabe você não havia escrito um roteiro só seu. Mas os únicos passos ali eram os meus, entrando no elevador quando a luz acendeu e fechando os olhos, justamente quando Something começava a tocar ali por perto.